Vivemos, durante toda a nossa vida, numa busca incessante pelo conforto, pela estabilidade, pela paz. Procuramos, mesmo que acreditemos que não o fazemos, durante toda a nossa vida, pertencer a algo, a alguém. Assusta-nos ficarmos sozinhos, assusta-nos morrermos sozinhos. Imaginamos o nosso futuro e, inevitavelmente, imaginamo-lo perto de alguém. Conseguimos ver os sorrisos, ver as conquistas. Criamos uma casa vazia onde, aos poucos, o vazio se vai enchendo e vai dando lugar a um "nós" que jamais poderei ser só "eu": de móveis, de quadros, de pessoas, de memórias. O mar, com toda a sua irreverência, avança e recua, e nós, ali, nunca sozinhos, deixamos que ele nos molhe os pés, que ele nos molhe os pés até já não os sentirmos, de tão frios que estão. Vamos, então, para casa e aquecemos os pés um ao outro. O sol, também esse indomável, faz sentirmo-nos livres, livres para passear, para descobrir, para acreditar que o dia não acabará, e que nessa luta entre a luz e a imensidão das trevas, o sol vencerá. Nós os dois, que jamais imaginaremos estar sozinhos, iremos cuidar das sardas que alegram o rosto um do outro; iremos encontrar uma sombra que nos acolha de braços abertos e que nos faça conseguir ler aquele livro que ambos gostamos, apesar do sol imenso dessa tarde de primavera. À noite, quando o dia não vencer, e as estrelas teimarem em esconder-se, nunca nos sentiremos às escuras: eu serei a tua luz, tu serás a minha. Quando não souberes para onde ir, eu saberei onde te levar. Quando me sentir perdida, cheia de tudo e farta de nada, procurar-te-ei, e mesmo que nada esteja a nosso favor, e que todas as casas estejam ocupadas, todas as casas que poderiam ser nossas, e nas quais guardaríamos memórias, cores, sonhos, ficaremos, juntos, debaixo daquela ponte onde um dia nos podíamos ter cruzado. Não nos parece justo, assim sendo, não termos a oportunidade maravilhosa que é sermos felizes com alguém. Não nos parece justo que não tenhamos ninguém que sinta os nossos lábios, que queira envolver-nos nos seus braços e que veja em nós aquilo que mais ninguém viu. A beleza do meu acordar, a forma como os meus cabelos preenchem as minhas costas, a maneira como vejo o Mundo. Não somos mais, nem menos, e só pedimos que alguém que nos ame, nos compreenda, nos estime. Só queremos que exista alguém, por aí, que não peça demasiado, mas também não espere tão pouco. Que se aventure connosco nisto que é a vida, e que queira ler muito, viajar muito, sonhar muito, e sonhar alto. Que nos dê uma oportunidade para aprendermos, para nos apaixonarmos, para nos libertarmos. Procuramos uma companhia. Que não nos deixe morrer assim, sem ninguém, e que quando partirmos, nos recorde com saudades e conte, àqueles que o rodeiam, as nossas peripécias, as nossas histórias, os nossos feitos.
Não imaginamos estar sozinhos, porque isso parece implicar não ter filhos, não ter família, não ter almoços ao domingo, não ter surpresas depois de um dia cansativo de trabalho. Não imaginamos estar sozinhos porque, quando o estamos, parece que toda a gente tem alguém, e como é horrível ter de pôr sempre a chave na porta e nunca ninguém nos abrir quando tocamos à campainha. O que está em causa não é o agora, é, mas não é. É mais o futuro, essa incerteza sobre a qual tanto especulamos. É assustador, e ao mesmo tempo fascinante, não sabermos se daqui a alguns anos pertenceremos a algo, a alguém. Se teremos uma casa para mobilar, com coisas materiais, mas principalmente com aquelas que não o são; e não conseguirmos prepararmo-nos para a solidão, ou, por outro, para o amor, para a partilha, para a dor do outro, que, quando se ama, nos entristece mais que a nossa. E sonhamos, sonharemos sempre, e por mais que pensemos nisso provavelmente tudo será tão diferente, talvez melhor, talvez pior.
O importante é que, por mais que tenhamos medo de estarmos sozinhos, percebamos que a solidão não é sinónimo de tristeza, de rua amargurada, de céu cinzento. Que existem restaurantes abertos ao domingo, e que podemos reservar mesa só para um. Que viajar é a forma mais emocionante de nos afirmamos como seres livres, e que o facto de ninguém aplaudir as nossas batalhas ganhas não quer dizer que não tenhamos sido fantásticos.
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