terça-feira, 19 de julho de 2011

O meu futuro

(...) Ouvem-se vozes abafadas e risos nervosos. O meu coração está a acelarar, assusto--me. O tempo passa, os minutos tornam-se segundos e o momento que ansiei que não chegasse, chegou.
              Estou imóvel, está a chover e a sala ficou deserta. Já tocou e toda gente saiu à pressa. Não os percebo, juro que não! O intervalo durava dez minutos apenas, e depois... Depois vamos todos para o anfiteatro, ter a palestra tão falada pelos adultos. Sabem a que me refiro? O meu futuro, o meu futuro promissor ou não, confuso ou certo, decidir-se-ia naqueles momentos e só eu o poderia decidir. Era nestes momentos que tinha pena de não ser ainda uma criança, de não ser autónoma como era.

A palestra seria dada por uma professora da Universidade de Coimbra e falaríamos do nosso futuro. Todos os alunos do décimo ano teriam de apresentar o seu trabalho, um trabalho que iria explicar aos outros o que queríamos do nosso futuro e como o iríamos desviar da miséria. Também eu fiz um trabalho. Demorei dias a fim, horas e horas na insegurança das minhas palavras, mas, finalmente, acabei. Acabei de inserir as imagens, escrevi a definição das profissões que mexiam comigo e expus os meus planos futuristas.

(...) Tocou. Sentei-me ao pé da turma B e esperei receber ordens para apresentar o meu trabalho. Até lá, ouvi atentamente o que todos diziam. Bem, todos sabiam o que queriam do seu futuro! A Inês mostrou que queria seguir advocacia, até representou uma cena jurídica. O João disse que queria ser polícia... Não aguentava crimes! O Tiago teve uma apresentação emotiva, soltaram-se lágrimas; contou a história da sua vida... Viveu a ver o pai a pilotar aviões e, de um dia para o outro, o seu querido pai despistou-se numa das viagens, numa das tantas viagens que já tinha feito. Ficou tetraplégico. Andar de avião, voltar a pilotar? Nunca mais. E, por isso, Tiago quer ser piloto. Quer honrar a memória do pai e servir as pessoas tal com o seu querido pai serviu.

«Íris Ferreira?», a voz da professora a pronunciar o meu nome soava na minha cabeça. Seria a minha vez? Dever-me-ia levantar? Todos os barulhos e barulhinhos foram silenciados pela minha respiração, a professora voltou a chamar-me. Era a minha vez, levantei-me cuidadosamente para não engelhar a minha blusa cor-de-rosa e segui em frente. Se ia confiante, enfrentando os meus colegas com o olhar? Não sei responder a isso, tudo o que se passou antes daquela apresentação sumiu-se das minhas memórias. A minha voz trémula torna-se confiante e tudo o que sinto sai cá para fora. Começo a apresentar. O meu trabalho resume-se ao desenho que fiz no quadro: um gigante ponto de interrogação.

Acho que as pessoas trocam olhares de incerteza. Começei a falar:

«Fiquei horas a fio parada em frente ao computador, à espera que os meus dedos tivessem alguma ligação com o teclado, mas, tal como eu, tinham receio de errar. Percebi que o futuro é o risco mais apetecível que temos nas nossas mãos, em nossa posse.  Percebi que tudo aquilo que construímos, todas as horas que estudámos para fazer de nós úteis podem ter sido esforços inúteis. Percebi que se queremos ser desportistas, nunca podemos desistir, não nos podemos deixar ir abaixo por causa de uma lesão mais grave e que, principalmente, temos de aproveitar todos os minutos do jogo para sermos felizes. Percebi que nada é certo e que o incerto nos traz força. Percebi o quão gosto de estudar e o receio que tenho de ir para o mundo do trabalho. Resumindo, aprendi que não sei o que quero do meu futuro. Nós não o podemos planear pormenorizadamente; o máximo que podemos fazer é tentar que ele tenha um rumo. Pois bem, quando isso não acontece, olhamos para trás e vemos que tudo poderia ter sido diferente, que poderíamos ter dado mais do que demos, que a nossa vida não foi escrita quando nascemos e que não vai ser apaga quando partirmos. O futuro vai ser sempre uma surpresa.»

(...) Falei quinze minutos sobre a minha vida, sobre o facto de querer estruturar família e trabalhar na área que gosto, sem qualquer auxílio de papel ou rascunho.

Foi magnífico, segundo os meus colegas. Elogiaram o meu ponto de vista e perguntaram-me como é que eu tinha esta idéia da vida.

(...) Sorri.


1 comentário:

  1. "Percebi que se queremos ser desportistas, nunca podemos desistir, não nos podemos deixar ir abaixo por causa de uma lesão mais grave e que, principalmente, temos de aproveitar todos os minutos do jogo para sermos felizes." és forte, nunca te esqueças francisca!

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