quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Tempo

Quando os nossos olhares se cruzaram pela primeira vez, e com os teus olhos me abriste as portas para o Oceano, eu afastei-me, porque a imensidão dos mesmos assustou-me, e eu fujo de tudo aquilo que me parece maior que eu. Voltámos a encontrar-nos nos corredores da vida, que desde aí pareceram ser poucos e impossíveis de não serem os mesmos, e eu prometi a mim mesma que não levantaria o rosto, com receio de que me sugasses para esse teu Mundo que é tão diferente e tão mais complexo do que o meu. Sem sucesso, tocaste-me na face e disseste-me que nada temesse, porque estarias comigo quando as ondas maiores me cobrissem o rosto e me fizessem sentir que poderia não regressar à tona da água. Deixei-me embalar todas as vezes em que decidi não o fazer, e, sem dar por mim, perdi o Norte que há tanto tempo me guiava, sem surpresas.

Deste-me uma rosa e eu, com receio de que me ferisse com os seus espinhos, nunca a quis aceitar. Deixaste-a no muro de minha casa e, durante semanas a fio, ela lá ficou. Um dia, ganhei coragem, aproximei-me dela e agarrei-a, como se se tratasse de algo tão distante que já não estava ali. Com cuidado, tomei-a como minha e, tal como me tinhas dito, a mesma não tinha espinhos: era vermelha, linda como me dizias ser, mas já estava a murchar. Tinha esperado demasiado tempo… O cheiro dissipara-se no meio de todos os outros, a cor tinha começado a esvoaçar para se confundir com a cor das paredes rosa que cercavam o meu lar e as pétalas caíam à medida que os segundos passavam e eu a agarrava junto ao peito.

Também me ofereceste uma chávena de café, e pediste-me que a bebesse contigo, enquanto conversávamos sobre todos os planos que já tinhas feito para nós. Recusei, porque o café faz-me despertar, e eu queria continuar a dormir, como se a vida, para mim, estivesse a ser um sonho e a realidade me melindrasse, por nela ter de tomar decisões e não poder apenas fazer aquilo que me ia passando pela cabeça. Passadas umas semanas, antes de uma noite de estudo, em que descansar não era a solução, fui à mesa onde me tinhas convidado para nos sentarmos, em busca do café, e ele lá continuava, mas estava frio, e toda gente sabe que café frio é intragável. Tinha esperado demasiado tempo...

Convidaste-me para assistir contigo a um concerto de uma banda que sempre admirei; para ver um filme que estava em exibição no cinema durante um tempo; para visitar uma exposição, daquelas que vão passando pelos vários museus, e que, dias depois, sairía de Lisboa... E eu, com medo, na minha inocência de que os segundos passariam mais devagar se a eles não sucumbisse, deixei o tempo passar, e quando quis tornar-me dona dele, ele já tinha passado e eu, mais uma vez, tinha esperado demasiado tempo... A banda terminou a sua digressão, o filme saiu de cena e a exposição já está numa cidade longínqua da nossa.

Perdoa-me por crer que há sempre tempo. Por ter de pensar demasiado em tudo, e por ver, na impulsividade, uma sala escura que só iluminada pela razão se torna habitável para nós. Não me recrimines por esperar que os prados fiquem coloridos pela Primavera para neles passear, nem por aguardar pacientemente que o Inverno chegue para ficar um sábado inteiro em casa. Eu tenho medo. Tenho muitos medos. E a tua completude assustou-me, bem como o teu sorriso nervoso e o toque da tua mão na minha, sem que dessémos pelas mesmas a aproximarem-se. Tu não imaginas como quero esquecer o Mundo e encontrá-lo no teu abraço. Não imaginas como quero esquecer o Mundo e encontrá-lo no teu colo. Tu, por culpa minha, não imaginas como gosto de ti. Como me deixas num vazio abismático quando te vais embora, e em como desejei tantas vezes que ficasses quando te disse que não te queria comigo. Se soubesse que esperar demasiado findaria o tempo que temos, não tinha deixado que o tempo passasse.

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