terça-feira, 7 de agosto de 2012

Em favor da verdade

- Não peço que ignorem as provas, que não ouçam os testemunhos ou que rasguem as fotografias do local do crime. Peço-vos que olhem para este homem.
Era assim que João, advogado formado numa das melhores universidades, se estreava nos tribunais. A defender o seu próprio pai.
O silêncio instalava-se na sala de audiências, naquilo que parecia ser um momento ambíguo de reflexão. Pouco mais havia para dizer: o advogado de acusação já tinha tentado persuadir o juíz, a família da vítima já tinha deixado no chão as lágrimas da perda e até o seu pai já tinha tido direito a intervir. Aquele era o momento crucial, o momento de todas as decisões. Era agora, ou nunca. Qualquer palavra a mais podia arruinar tudo e, uma frase esquecida, deixar o seu pai a apodrecer na prisão.
João sentia-se tenso, pouco confiante e sobretudo confuso. Estava a defender o seu pai, aquele homem que sempre vira como alguém bom e corajoso, o herói das composições da primária e o guerreiro na vida adulta. Estava a defendê-lo de um homicídio que duas testemunhas alegavam ter visto, onde o seu pai agredia, brutalmente e a sangue frio, uma mulher que vira na rua. Para piorar a situação, estas duas testemunhas eram crianças, e, em todo o seu depoimento coletivo, emocionaram as pessoas da sala. Ia perder o caso. Não, não era isso que lhe importava. Ele sabia que aquilo era verdade, as crianças daquela idade não mentiam, nem conseguiam imaginar a mãe a ser esfaqueada por um desconhecido.
-Ele é meu pai. A minha mãe e a minha irmã morreram pouco depois de eu ter completado dez anos, num assalto à mão armada. Eu assisti a tudo. Sei o que estas crianças passaram, mas o meu pai sabe também o trauma que foi ver a minha mãe a sucumbir. Como advogado, só vos posso pedir que reconsiderem e que vejam que o que aconteceu deve-se aos problemas psíquicos que o meu pai enfrenta depois daquela manhã horrível do funeral. Como filho, só vos posso pedir que não levem a única pessoa que tenho. É tudo.

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